Entrevista com A Dra. Gale Ridge

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[versión en Español]

[Transcrição da Entrevista]

 

Em nosso quarto episódio da série Voices of Local Leaders, entrevistamos a Dra. Gale Ridge, uma pianista concertista que se tornou pesquisadora de insetos na estação experimental Connecticut Agricultural Experiment Station. Embora a especialidade da Dra. Ridge seja o comportamento de percevejos, ela ajudou a resolver vários mistérios relacionados a insetos, desde o transporte intercontinental de insetos exóticos, a entomologia forense em casos de assassinato, até transtornos mentais nos quais os pacientes acreditam que estão sendo alimentados por insetos. Como ela ressalta na entrevista, sua curiosidade e atenção aos detalhes prevaleceram em sua vida e são uma força motriz que facilitou sua transição do trabalho no palco do teatro para o microscópio em seu laboratório. Sua paixão por criaturas de seis pernas e sua compaixão por alunos e paciente são inspiradores e farão você querer aprender mais sobre o trabalho dela!



Transcrição da Entrevista

“Olá, eu sou a Dra. Gale Ridge, especialista em identificação de insetos da estação experimental Connecticut Agricultural Experiment Station. Nossos escritórios são abertos ao público e atendemos a todos no estado. Qualquer pessoa que tenha um problema ou dúvida sobre insetos, ácaros, aranhas, qualquer coisa que tenha mais de quatro patas, eu e minha assistente Katherine somos as pessoas a quem a maioria das pessoas procura. Alguém entra e diz 'O que é isso?' E eu digo 'Eu nunca vi isso antes.' Então ficamos muito ocupados tentando descobrir de onde esse pequeno visitante vem, e muitas vezes [é] de outras partes do mundo. Então, eu tenho meu dedo no pulso da entomologia de identificação de todo o mundo por causa do meu título. Com o passar dos anos, meu trabalho evoluiu para pesquisa em comportamento e características de percevejos que se alimentam de [sangue de] humanos, e atualmente estou em um projeto bem grande ajudando pessoas com delírios de infestações, que é a crença de ser consumido por insetos ou outros patógenos ou parasitas. [Esse projeto] é muito complicado e é um esforço internacional para fornecer informações para pessoas e prestadores de serviços que estão lidando com esta condição específica. Outra coisa empolgante é que também sou um pouco hábil em entomologia forense e também estive envolvida em alguns casos de assassinato aqui em Connecticut. Portanto, este trabalho está longe de ser enfadonho!”

[Science Yourself] O que te motiva a explorar esses diferentes tópicos em seu trabalho?

[Dra. Gale Ridge] Curiosidade! Com a identificação, eu sou um posto de observação para a introdução de insetos exóticos, e uma das [situações] mais emocionante e interessante foi quando uma mulher trouxe um cabideiro de pendurar na parede. Ele foi comprado em uma loja local na cidade de Danbury. Ela o pendurou na parede e então uma espécie de pó começou a cair por debaixo dele. Ela o trouxe e perguntou 'O que está acontecendo?' E o que havia nele era uma população de besouros vivos. Eu os examinei no microscópio e disse 'Estes não são nossos residentes locais; de onde eles vêm?'

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Cabideiro indiano com uma população viva de besouros da África Oriental identificada pela Dra. Gale Ridge

Então, rastreando a linha de venda, descobri que este pedaço de madeira em particular era da África Oriental. Ele havia sido colhido na África Oriental, enviado para a Índia, fundido e transformado neste cabideiro de parede lá na Índia, e então trazido para os Estados Unidos e distribuído. Meu trabalho é muito parecido com o de um cão de caça: você percebe um cheiro e tenta segui-lo. É como descascar uma cebola: as coisas que estão escondidas se revelam; e você começa a cavar mais e mais e mais fundo. Eu estive envolvida em alguns casos de assassinato como entomologista forense. Você pode imaginar que a cebola era particularmente fascinante!

“A fonte de origem da ciência é mesma da arte. Os mundos podem parecer muito díspares e separados, mas os fundamentos são os mesmos: atenção aos detalhes, ser um pouco perfeccionista, sempre curioso, sempre fazer perguntas”

[Science Yourself] O que te inspirou a começar a trabalhar com artrópodes e se a tornar uma entomologista?

[Dra. Gale Ridge] Bem, eu comecei tarde. Minha primeira carreira foi como pianista concertista e professora em uma compania que trabalhava com teatro musical e como solista. E eu cheguei a um ponto na minha vida em que era uma mãe solteira de três filhos pequenos. Como música profissional, isso não funciona muito bem quando você está tentando criar filhos porque, quando eles estão em casa, você está trabalhando fora porque música é durante o período de socialização da população. Nós músicos temos que esperar até o final do dia para fazer o nosso melhor trabalho. Tornou-se muito difícil seguir uma carreira musical em tempo integral com os jovens. Então, naquele ponto, eu passei para as ciências biológicas. Eu tive um interesse porque eu fui criada em uma fazenda no oeste da Inglaterra, então cresci em meio à natureza e fui uma observadora desde muito jovem. Então, eu tinha aquele interesse básico. E então a estação experimental anunciou que eles queriam um assistente de verão no departamento de entomologia, e foi quando eu estava começando meus cursos. Você sabe, ir de música para ciências, você tem que provar que pode fazer isso! Eu atendi o anúncio e fiquei bastante fascinada por insetos. E não há dois dias iguais quando você está trabalhando com eles. É uma variedade tão grande e eu pensei 'Esta seria uma profissão fascinante para me aprofundar.' E aqui estou eu!

 

[Science Yourself] O que te inspirou a se interessar por ciências em geral?

[Dra. Gale Ridge] Eu venho de uma vida de belas artes e o desejo de satisfazer a curiosidade. E com isso, um apreço por perfeição e detalhe. É um tipo de mentalidade, mas também ter a liberdade da criatividade e do questionamento. A fonte de origem da ciência é mesma da arte. Os mundos podem parecer muito díspares e separados, mas os fundamentos são os mesmos: atenção aos detalhes, ser um pouco perfeccionista, sempre curioso, sempre fazer perguntas. E a ciência permite que você seja uma espécie de cavalo de corrida criado com desejo de correr. E você está correndo com essas ideias e conceitos, em uma estrutura segura, firme e baseada em princípios. E a ciência também permite que você seja muito criativo. Acho que a ciência como uma arte, a ciência como uma disciplina, se você permitir uma presença de espírito de estar no momento e ter a mente aberta. É simplesmente a revelação da descoberta. Sempre há algo que você pode encontrar. E a ciência tem essa potência de informação e de história sobre a qual você pode construir.

 

[Science Yourself] Qual é um mito ou equívoco comum que você já encontrou no seu trabalho?

[Dra. Gale Ridge] Um mito clássico que está por toda parte é que os percevejos se alimentam em linha reta: café da manhã... almoço... jantar. Eu sou uma pesquisadora de comportamento de percevejos e eu procuro um calcanhar de Aquiles nesse comportamento que podemos entender melhor e usar para controlar essas criaturas.

A maioria das pesquisas é sobre como matá-los. Mas, eu estudo o comportamento deles, então, com esse conhecimento, posso fornecer informações alternativas das quais alguém em particular precise. Percevejos são, na verdade, muito delicados, são comedores muito exigentes, nunca se alimentam em linha reta porque se alimentam em vasos capilares e nós não temos capilares retos em nosso corpo. O único caso em que vi qualquer tipo de alimentação em linha reta é se eles estão se alimentando ao longo da linha de algumas roupas e, então, talvez um ou dois deles estejam lá. É o único momento em que possivelmente seria o caso. Mas esse mito ficou preso na psique da sociedade para sempre. E uma vez que você obtenha a desinformação inicial, ela pode permanecer e ser perpetuada.

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Dra. Gale Ridge em seu laboratório na estação experimental Connecticut Agricultural Experiment Station (New Haven, CT)

“Eu fiz essas pessoas entenderem, eu as eduquei, e então as pessoas vão embora muito mais fortalecidas, muito mais felizes, muito relaxadas e não tão intimidadas por algo que eles não compreendiam quando entraram pela porta”

 

[Science Yourself] Como você usa a ciência e apresenta seu conhecimento como especialista para educar o público e ajudá-lo a reavaliar uma desinformação?

[Dra. Gale Ridge] Eu lido com isso o tempo todo. A maioria das conversas que tenho com as pessoas é decorrente da desinformação que eles obtêm da Internet e dos mecanismos de pesquisa do Google, Facebook, Twitter e até do YouTube. É difícil quando alguém obtém informações iniciais erradas para, então, como a especialista com quem está falando, desligar essa conectividade de informações iniciais. Ela é muito poderosa. Meu trabalho é ser capaz de substituir essas informações por informações corretas. Às vezes é mais fácil e às vezes é mais difícil. Na verdade, estamos culturalmente imersos nesse medo de artrópodes. Quando estou trabalhando com pessoas, frequentemente estou lidando com situações de ansiedade. Então, ao invés de falar para eles (o que é fácil), eu converso com eles. Em vez de ficar de frente para eles (como se você e eu estamos olhando um para o outro), eu me viro para ficarmos lado a lado. E nós caminhamos juntos, por uma trilha, e eu guio descoberta deles de novas informações e uma nova maneira de encará-las. Muitas vezes, tenho pessoas voltando para mim, no final da sessão, e dizendo 'Oh, eles são meio fofos! Você gosta deles, não é? Agora eu posso entender, pois terminamos [a sessão]!' Eu fiz essas pessoas entenderem, eu as eduquei, e então as pessoas vão embora muito mais fortalecidas, muito mais felizes, muito relaxadas e não tão intimidadas por algo que eles não compreendiam quando entraram pela porta.

 

[Science Yourself] Qual seria o seu conselho para alguém que pode estar pensando em mudar de carreira, é fascinado por ciência e insetos e está pensando seriamente em se tornar um entomologista?

[Dra. Gale Ridge] Um dos meus primeiros professores, que na verdade é um especialista em gambás, e não conseguia descobrir por que gambás (que são basicamente criaturas tropicais da América do Sul que se auto introduziram nos Estados Unidos) aguentam o frio daqui, porque eles são basicamente carecas. Então ele estava fazendo pesquisas sobre gambás carecas. De qualquer forma, quando você passa para uma nova profissão, a antena está sempre em alerta. Há um frescor de interação e, durante esse novo período, ele disse algo que foi muito profundo para mim: 'Quando você está estudando um assunto, sempre veja a tela completa; mas, ao mesmo tempo, veja os detalhes.' Uma boa analogia é olhar para a árvore, mas também olhar para a floresta. Olhe para o céu, olhe para o horizonte, mas olhe também para o assunto de que está falando. Você tem que ter contexto! Meu sentimento ao se tornar uma entomologista é ter o conhecimento de ecologia e evolução. Grande parte de evolução é impulsionada pela pesquisa com insetos e como eles reagem ao meio ambiente e às pressões negativas contra eles. E o quão rápido ela pode acontecer; com insetos, você pode ver mudanças fundamentais em 10 anos. Então, quando você está trabalhando em evolução, estudar insetos e artrópodes na verdade é muito revelador porque pode estar dentro da escala de tempo de sua própria carreira. Porque realmente temos 40-50 anos de carreira ... isso não é nada! Assim, pequenos artrópodes são realmente notáveis por serem capazes de nos revelar nosso lugar na vida, a própria vida e como o planeta funciona. Tudo revolve em torno dos insetos. Pilotos chamam os insetos de 'plâncton do céu.' E a qualquer momento que você está no subúrbio, você olha para cima e provavelmente há cerca de 17 espécies de artrópodes viajando sobre nossas cabeças. Eles podem se mover entre continentes. Eles podem usar os ventos da África para cruzar o [oceano] Atlântico até a América do Norte. Estas são apenas pequenas criaturas notáveis. Então, se você está indo para a entomologia ou profissões associadas à entomologia, evolução e ecologia são certos aspectos que você deve estudar, e eles são muito divertidos!


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