Entrevista com David Carter
Em nosso segundo episódio da série Voices of Local Leaders, entrevistamos David Carter, um dos facilitadores do program ‘Neighborhood Leadership Program’ (NLP) da Community Foundation for Greater New Haven. Após 30 anos trabalhando como gerente de projetos, David decidiu mudar sua carreira e se dedicar a ajudar líderes locais a fazer a diferença em suas comunidades. De profissional do qual era esperado ter todas as respostas a encarar de braços abertos desafios inesperados para o desenvolvimento de comunidades, a jornada de David foi centrada em ouvir atentamente e aprender. Não por acaso, ambas atitudes constituem dois dos principais pilares do programa de NLP. Mas elas não são fundamentais apenas para a solução criativa de problemas da comunidade. Eles também incorporam aspectos essenciais do pensamento crítico e da mentalidade científica que promovemos aqui na Science Yourself. Nós realmente acreditamos que a experiência e as perspectivas de David ilustram como todos podem se beneficiar de uma comunidade cientificamente letrada e empática!
Transcrição da Entrevista
"Meu nome é David Carter. Sou formado como arquiteto e trabalhei como gerente de projetos na área por 30 anos. Mas eu sempre senti que estava faltando alguma coisa. Há cerca de 25 anos me envolvi com o esforço de Organização Comunitária, cujas bases eram encontros e conversas individuais com as pessoas. Isso despertou em mim algo que faltava no meu trabalho profissional. Em 2008, quando a economia despencou e tive que encontrar uma nova maneira de me sustentar, percebi que era isso que estava me chamando. Então, fui treinado como treinador de liderança e comecei a trabalhar com grupos sobre como melhorar o impacto deles e o trabalho interno que eles precisavam fazer para serem mais eficazes. Isso me levou a uma colaboração com o Rev. Kev Ewing, que conheci por meio do trabalho do esforço de Organização Comunitária. Ele e eu (ele por um longo tempo, eu intermitentemente) temos trabalhado com um programa chamado 'Programa de Subsídio da Vizinhança.' Nós nos reunimos e envolvemos Lee Cruz (da Community Foundation [for Greater New Haven]) para mudar para, em vez de um programa de subsídio com um pouco de treinamento de liderança, um programa de liderança com algum dinheiro para subsídio. Isso foi um novo tipo de trabalho para eles; geralmente [a fundação] dá dinheiro a organizações sem fins lucrativos para que façam o que estão fazendo. Isso foi uma espécie de semeadura de liderança e bom trabalho na comunidade. Percebemos que isso era onde nossos corações estavam e onde se fazia um uso mais eficaz de nosso tempo. Então, temos feito isso juntos neste formato há seis anos. E ainda estamos aprendendo. Essas conversas pessoais e intencionais realmente me acordaram para algo. Ainda estou motivado por querer compartilhar essa experiência de forma ampla e acho que isso tem um impacto na maneira como vivemos juntos."
[Science Yourself] Um grande foco de seu programa de treinamento de liderança é aprender com a comunidade antes de agir. Por que você acha que isso é importante?
[David Carter] O modelo tradicional de desenvolvimento comunitário de cima para baixo ("top-down") tem um grupo de especialistas fazendo uma avaliação das necessidades e reunindo todos os seus dados para dizer: "Bem, esses são os recursos necessários e aqui está como podemos impô-los à comunidade." Eu acho que é um modelo débil! A abordagem que promovemos no 'Programa de Liderança da Vizinhança' é um modelo de relação, onde as pessoas que querem fazer a diferença (e são as pessoas que se auto-selecionaram para o programa), nós as encorajamos a ir e conversar com as pessoas individualmente na comunidade para descobrir o que realmente está acontecendo, quais são os problemas reais, quais são as oportunidades reais e o que pode ser necessário para fazer a mudança que eles desejam. Isso dá a eles um tipo de evidência narrativa, que eu acho mais poderoso. Ao mesmo tempo em que você ouve e presta atenção no que emerge [na conversa] e o que é necessário, você também está construindo conexões.
Eu acho que a mudança ficou clara para mim quando deixei de lado meu papel de gerente de projeto, onde era meu trabalho ter todos os detalhes, organizá-los, fazer fluxogramas e planilhas e ter todas as respostas. Se você acha que tem as respostas, não consegue ouvir qual é o problema. Portanto, é realmente relaxante estar fundamentado no que é importante para você e em qual é o seu propósito, mas ser humilde e flexível e ouvir. E isso aparece em todos os aspectos da minha vida agora, nas minhas relações interpessoais com minha família, no encontro profissional com pessoas e nos treinamentos que ofereço. Então, é uma mentalidade diferente. Às vezes, as pessoas falam sobre você ter uma mentalidade de execução e uma mentalidade de aprendizado, e que elas são diferentes. Acho que elas se sobrepõem o tempo todo e, na melhor das hipóteses, elas suportam uma à outra. Você não pode realmente executar sem aprender, e você não pode aprender sem executar. Portanto, o [projeto] piloto é um exemplo de como você se coloca em um modo de execução, mas ainda dentro de uma estrutura de aprendizado.
“Se você acha que tem as respostas, não consegue ouvir qual é o problema”
[Science Yourself] Qual é a ideia por trás dos projetos-piloto? Por que você acha que seja importante testar na prática algumas das suposições sobre a comunidade e os serviços a serem prestados?
[David Carter] Os [projetos] pilotos são especificamente orientados para tentar obter algumas informações mais aprofundadas sobre algo observado na comunidade. Então, você consegue ir um pouco mais fundo, ver se a maneira como você entende isso realmente se revela. Muitas pessoas que procuram o programa têm ideias sobre como resolver alguns dos problemas de saúde que aparecem em comunidades pobres, [como, por exemplo] obesidade, diabetes e má nutrição, e pensam: "Vou apenas dar à comunidade boas informações sobre o que é comida saudável e onde obtê-la." E eles aprenderam consistentemente que a informação não é suficiente. Quando eles começam a interagir com as pessoas, ensinando-as a cozinhar ou tendo as crianças envolvidas (para que as crianças vejam seus pais de uma maneira diferente), [essa é] a mudança social que deve acontecer para apoiar a mudança nas coisas nutricionais. Isso é recorrente; quase todos os anos, há uma ou duas pessoas que estão lidando com isso e têm o mesmo momento de 'A-HA'.
A outra parte importante do [projeto] piloto é que o participante deve superar seus medos ou preocupações, ou construir sua capacidade de estar presente ao que precisa acontecer, de liderar um evento, se for o caso. É uma chance para eles intervirem no que disseram que queriam fazer. E há um enorme aprendizado pessoal ali, assim como um aprendizado da comunidade sobre o que está realmente funcionando.
[Science Yourself] Como você apoia os participantes quando essas avaliações críticas revelam que eles estavam errados quanto às suposições ou ao plano de ação deles?
[David Carter] "Respire fundo" é uma grande parte disso! Parte disso é normalizar o fracasso. Se você está tentando algo novo, falhe cedo e frequentemente, para que possa aprender mais rápido. Isso não acalma necessariamente o coração da pessoa que ficou desapontada. As pessoas não apareceram [para o evento] ou não agiram da maneira esperada. E esse é um dos motivos pelos quais as equipes de apoio são tão importantes, porque, quando o participante está realizando seu [projeto] piloto, eles têm um time de pessoas que os acompanharam na jornada de desenvolvimento e podem ajudá-los a entender e aprender com tudo o que deu errado ou as surpresas que surgiram.
“Se você está tentando algo novo, falhe cedo e frequentemente, para que possa aprender mais rápido”
[Science Yourself] O que são as equipes de apoio? O que você acha ser o principal benefício dessas equipes?
[David Carter] Ao longo dos vários meses do programa, quando você está trabalhando em estreita colaboração com duas ou três outras pessoas todas as semanas no que cada um de vocês está trazendo ou tentando fazer, você desenvolve habilidades de falar sobre seu programa, você desenvolve habilidades para ouvir outra pessoa falando sobre o programa delas e como ser um ouvinte eficaz, não dando à outra pessoa a resposta, mas sugerindo coisas ou fazendo perguntas. Acho que essas habilidades são desenvolvidas nessa equipe [de apoio] e, neste ano [2020], a maioria dessas conexões persistiu além do programa e as pessoas ainda estão em contato umas com as outras, que é aquela parte do tecido comunitário. Então, são as pessoas que conhecem você e em quem você confia para serem uma caixa de ressonância para suas ideias e que aprenderam a ver mais profundamente o que você está fazendo (não apenas o projeto) e como isso se relaciona com seus valores profundos, seus objetivos profundos e o que é fundamental para você.
“Se você está empacado tentando entender ou resolver um problema, mude de perspectiva”
[Science Yourself] Qual seria seu conselho para alguém que é fascinado por envolvimento da comunidade e está pensando seriamente em se tornar um instrutor para ajudar os líderes comunitários a seguir em frente com seus projetos?
[David Carter] Meus professores da escola de arquitetura me ensinaram (o que eu gostaria de ter aprendido antes) a "nunca ficar bom em algo que você não gosta de fazer!" Porque você vai acabar fazendo, porque as pessoas vão descobrir ser útil e você não terá a chance de explorar as coisas em que pode ser mais eficaz. Outra lição do trabalho de arquitetura foi: "se você está empacado tentando entender ou resolver um problema, mude de perspectiva." Então, em arquitetura, se eu estivesse estudando um projeto em vista de plano e não estivesse funcionando, eu olharia para a vista de elevação ou vista de seção para ver como as peças se relacionam em um eixo diferente. Esteja ciente da perspectiva que você está assumindo quando está trabalhando em algo e seja capaz de mudar, para que possa ter uma compreensão diferente. Parte das conversas individuais é que você está ouvindo as opiniões de outras pessoas sobre coisas que te preocupam.
Abandonar a necessidade de ser a pessoa que tem as respostas, mas estar fundamentado na minha intenção ("Por que estou fazendo isso? Qual é o meu propósito aqui?"), e então, deixar de lado meus preconceitos, de maneira que eu possa realmente estar presente e prestar atenção ao que está realmente acontecendo. Perceber que não precisava ter a resposta, e nem mesmo precisava ser instrumental na resposta, mas que eu poderia simplesmente manter espaço para a pessoa que estava tentando criar algo.